sexta-feira, 20 de maio de 2022

As Filhas da Inquisição

Se eu ganhasse um US$ 1 dólar por cada vez que ouvi ao longo da minha caminhada espiritual, e também profissional como intérprete de símbolos, a frase: “Sabe, eu fui queimada nas fogueiras da inquisição”, ou coisa parecida, bem não digo que eu teria dinheiro suficiente para comprar uma Lamborghini, mas com certeza já teria um Jeep! É simplesmente incrível o tanto que essa fantasia imbecilizante rola na boca de mulheres que se dizem espiritualizadas. Começando pela lógica, nos quase 500 anos que durou a inquisição cerca de 9 milhões de pessoas foram executadas... Uma enormidade para a população europeia da Idade Média! Até os anos 60 a humanidade como um todo não tinha ultrapassado a quantia de 1 bilhão de pessoas. Imagine naqueles tempos! Bem, hoje entre América do Norte e Europa Ocidental, que teriam ao todo juntas mais de 600 milhões de habitantes, a bruxaria Wicca é muito divulgada e praticada! Digamos que 30 milhões (tirando por baixo) de mulheres sejam seguidoras dessa fé, todas se dizem as reencarnações das suas irmãs queimadas nas chamas medievais... Entendem o que digo? Os números não batem! Ignorando também, é claro, os milhões de homens que alegam o mesmo ou de terem tido nesse período encarnações femininas, e fora também os adeptos dessa fé na América do Sul, Oceania etc. Isso mais o fato de que as 9 milhões de vítimas não foram, nem de longe, uma maioria de mulheres!


A inquisição foi o mote principal para o clero eliminar inimigos da igreja, espoliar recursos, e de a sociedade se livrar de pessoas diferentes, estranhas, ou socialmente inaceitáveis, além de conspirações pessoais como se livrar de um casamento ruim! Pessoas muito feias ou com defeitos físicos, doenças congênitas ou raras foram consideradas malignas, bruxas ou parceiras delas e queimadas! O caso mais notório foi do o alemão Johannes Junius (1573/1628), queimado inocentemente na fogueira, e cuja carta escrita à sua filha Veronika é o maior testemunho da falsidade daqueles tribunais. No seu relato na sua cidade, Bamberg, centenas de homens e mulheres foram queimados vivos depois de confessarem sob tortura que eram bruxos, inventando histórias para se livrar de seus sofrimentos. Todos foram espoliados pelo bispado local. Então me parece também que há falta de estudo nessas alegações, bem como de pesquisa, e uma dose cavalar de bom senso ao sustentar essa fantasia sem fundamento! Cuja única função, ao que parece, é a de servir ao ressentimento mal trabalhado de muitas dessas pessoas, coisa de gente magoada pela vida, sem autoconhecimento nenhum. Só querendo dirigir sua raiva e frustração a alguém, a uma instituição, à própria igreja, ao patriarcado, e justificar seu próprio sentimento de inadequação familiar ou social. Não há nenhum ganho nisso, seja de transformação da consciência, ou elevação espiritual. As coisas foram o que foram, era o que o mundo tinha de consciência, como bem nos ensina a visão sistêmica de Bert Hellinger. Deixem o passado no passado, aprendam e o superem! Homens e mulheres, e até mesmo animais, foram condenados à fogueira. Foi uma verdadeira histeria coletiva onde tudo poderia ser considerado uma parceria demoníaca com as bruxas ou com o seu mestre.


A personagem “bruxa” ganhou contornos definidos nas fantasias misóginas dos inquisidores dominicanos Heinrich Kraemer e James Sprenger, em seu livro Malleus Maleficarum, o Martelo das Feiticeiras de 1486, onde descrevem formas absurdas de como identificar, capturar e punir as bruxas, além de descrever os “horrores” de seus malefícios... Enfim, aqueles caras mereciam mesmo é uma internação psiquiátrica! Depois disso todo o resto foi fantasia de Hollywood. Houve sim os pagãos que morrerem por suas crenças (como os cátaros e os valdenses), mas talvez não cheguem a 1 milhão. Todos aprenderam rapidamente a esconder suas crenças. Também os satanistas foram às chamas, porque sim, eles existiram! O satanismo foi a resposta a uma igreja opressora, haja visto que seus ritos são a inversão dos ritos clericais. Mas houve também os judeus que foram tidos como heréticos e servos de satã devido às passagens bíblicas sobre a vida de Cristo... Vá acrescentando isso aos 9 milhões de vítimas! A religião Wicca, na qual também fui iniciado, é uma maravilhosa proposta de resgate da sacralidade da natureza, e a exaltação do Sagrado Feminino e do Sagrado Masculino em sua mágica conexão Cósmica, geradora da vida. A versão de revanche das fogueiras não contribui em NADA para sua causa superior, e muito menos à sua imensa beleza!